O ritual yaokwa dos índios enawenê nawê, de Mato Grosso, que também se tornou patrimônio cultural
Em novembro o Conselho Consultivo do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) reconheceu, por unanimidade, o sistema agrícola do Rio Negro como patrimônio cultural brasileiro. O bem será registrado no Livro dos Modos de Fazer e o instituto deve apoiar a elaboração e implementação de um Plano de Salvaguarda.
A proposta de registro do sistema agrícola como patrimônio foi inicialmente feita pela Associação das Comunidades do Médio Rio Negro (Acimrn), com sede em Santa Isabel do Rio Negro e posteriormente a Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn) e a Associação Indígena de Barcelos (Asiba) incorporaram-se ao processo.
O sistema agrícola do Rio Negro é entendido como um conjunto de saberes e modos de transmissão de conhecimentos que se relacionam entre si, entre eles estão: a diversidade das plantas cultivadas, as técnicas de manejo da roça e dos quintais (os espaços de cultivo), o sistema alimentar (as receitas e processos de elaboração dos produtos da roça), os utensílios de processamento e armazenamento, ou seja, a cultura material e, por fim, a conformação de redes sociais de troca de plantas e conhecimentos associados. O cultivo da mandioca brava (Manihot esculenta), por meio da técnica de coivara e da rede de troca de saberes e plantas, é a base desse sistema, compartilhado por mais de 20 povos indígenas, os quais vivem ao longo do Rio Negro, em um território que abrange os municípios de Barcelos, Santa Isabel do Rio Negro e São Gabriel da Cachoeira, noroeste amazônico, até as fronteiras com a Colômbia e a Venezuela.
Neste sistema os utensílios de processamento da massa de mandioca e os cultivares são considerados seres com atributos semelhantes aos dos humanos com sentimentos e sociabilidade. Não se trata de um repertório de artefatos passivo, o forno de torrar a farinha, por exemplo, “sabe” se ela vai ficar boa ou não. As mandiocas se comunicam entre si e com as mulheres, que são as donas das roças. Estas características orientam a gestão do uso e produção destes bens compondo um aspecto do valor patrimonial do sistema.
Para saber mais sobre o Sistema Agrícola do Rio Negro e seu processo de registro como patrimônio clique aqui e aqui
Unanimidade entre os conselheiros do Iphan
Dos 24 conselheiros do Conselho Consultivo do instituto, 14 deles estiveram presentes em 5 de novembro e todos votaram pelo reconhecimento do sistema agrícola como Patrimônio Cultural Brasileiro. O relator do processo foi o antropólogo Roque de Barros Laraia, que elogiou o dossiê de suporte do registro. Laraia ressaltou que o texto do dossiê equaciona bem a complexidade do bem como um sistema, o que se apresenta como novidade nos processos de registro de bens imaterias do Iphan. O antropólogo salientou o trabalho primoroso da botânica Laure Emperaire, do Institut pour la Recherche et Development (IRD) e pesquisadora associada do ISA, em evidenciar a diversidade das plantas cultivadas, em especial da mandioca.
Jurema Souza Machado, arquiteta da Unesco e uma das conselheiras destacou que um dos riscos que ameaçam a atualização do sistema agrícola do Rio Negro relaciona-se ao fato de a juventude não se identificar com a atividade de fazer roça, atribuindo a ela uma imagem de atraso e de trabalho árduo. O relator, Roque Laraia, argumentou que o dossiê explicita esta preocupação e indica algumas possibilidades e iniciativas para aproximar a juventude.
Segurança alimentar e estratégias de salvaguarda
Durante o processo de formulação do dossiê e registro do sistema agrícola como patrimônio o ISA, o projeto de pesquisa Pacta (Populações, Agrobiodiversidade e Conhecimentos Tradicionais Associados/Unicamp-CNPq e IRD) e o próprio Iphan apoiaram a Acimrn e a Foirn na realização de encontros sobre patrimonialização, divulgação do processo de registro e levantamentos participativos acerca de iniciativas desejadas para a salvaguarda do bem. Com estas consultas, tornou-se patente a preocupação dos povos indígenas com a desvalorização de seus modos de vida, especialmente, em relação a transmissão de conhecimentos xamânicos, benzimentos e rituais, bem como, sobre as técnicas de tecer os utensílios e de processar os alimentos. A segurança alimentar, garantida pela base da diversidade de receitas e plantas cultivadas, também foi destacada como uma das preocupações nestes fóruns de discussão.
Desta forma, entre as ações de salvaguarda previstas no dossiê estão: a) mobilização de jovens indígenas para pesquisas e registros de audiovisual sobre o modo de fazer roça de antigamente, o atual e do futuro, sobre benzimentos e mitos de origem das plantas; b) valorização dos dabucuris (rituais de trocas de bens) e c) fomento a realização de feiras e outras modalidades de escoamento e valorização do produto regional.
Vale lembrar ainda que entre os dias 4 e 5 de novembro, o Conselho reconheceu outros cinco bens como Patrimônio Cultural Brasileiro: 1) Encontro das Águas do Rio Negro e Solimões, no Amazonas; 2) o ritual Yaokwa, dos índios Enawenê Nawê, que vivem na zona de transição entre o Cerrado e a Floresta Amazônica, em Mato Grosso; 3) o conjunto urbanístico e paisagístico da cidade de São Félix, na Bahia; 4) o Monumento aos Mortos da II Guerra Mundial, no Rio de Janeiro; 5) o conjunto histórico e paisagístico de Santa Tereza, no Rio Grande do Sul.
A proposta de registro do sistema agrícola como patrimônio foi inicialmente feita pela Associação das Comunidades do Médio Rio Negro (Acimrn), com sede em Santa Isabel do Rio Negro e posteriormente a Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn) e a Associação Indígena de Barcelos (Asiba) incorporaram-se ao processo.
O sistema agrícola do Rio Negro é entendido como um conjunto de saberes e modos de transmissão de conhecimentos que se relacionam entre si, entre eles estão: a diversidade das plantas cultivadas, as técnicas de manejo da roça e dos quintais (os espaços de cultivo), o sistema alimentar (as receitas e processos de elaboração dos produtos da roça), os utensílios de processamento e armazenamento, ou seja, a cultura material e, por fim, a conformação de redes sociais de troca de plantas e conhecimentos associados. O cultivo da mandioca brava (Manihot esculenta), por meio da técnica de coivara e da rede de troca de saberes e plantas, é a base desse sistema, compartilhado por mais de 20 povos indígenas, os quais vivem ao longo do Rio Negro, em um território que abrange os municípios de Barcelos, Santa Isabel do Rio Negro e São Gabriel da Cachoeira, noroeste amazônico, até as fronteiras com a Colômbia e a Venezuela.
Neste sistema os utensílios de processamento da massa de mandioca e os cultivares são considerados seres com atributos semelhantes aos dos humanos com sentimentos e sociabilidade. Não se trata de um repertório de artefatos passivo, o forno de torrar a farinha, por exemplo, “sabe” se ela vai ficar boa ou não. As mandiocas se comunicam entre si e com as mulheres, que são as donas das roças. Estas características orientam a gestão do uso e produção destes bens compondo um aspecto do valor patrimonial do sistema.
Para saber mais sobre o Sistema Agrícola do Rio Negro e seu processo de registro como patrimônio clique aqui e aqui
Unanimidade entre os conselheiros do Iphan
Dos 24 conselheiros do Conselho Consultivo do instituto, 14 deles estiveram presentes em 5 de novembro e todos votaram pelo reconhecimento do sistema agrícola como Patrimônio Cultural Brasileiro. O relator do processo foi o antropólogo Roque de Barros Laraia, que elogiou o dossiê de suporte do registro. Laraia ressaltou que o texto do dossiê equaciona bem a complexidade do bem como um sistema, o que se apresenta como novidade nos processos de registro de bens imaterias do Iphan. O antropólogo salientou o trabalho primoroso da botânica Laure Emperaire, do Institut pour la Recherche et Development (IRD) e pesquisadora associada do ISA, em evidenciar a diversidade das plantas cultivadas, em especial da mandioca.
Conselheiros votam no Palácio Gustavo Capanema, sede do Iphan no Rio de Janeiro |
Jurema Souza Machado, arquiteta da Unesco e uma das conselheiras destacou que um dos riscos que ameaçam a atualização do sistema agrícola do Rio Negro relaciona-se ao fato de a juventude não se identificar com a atividade de fazer roça, atribuindo a ela uma imagem de atraso e de trabalho árduo. O relator, Roque Laraia, argumentou que o dossiê explicita esta preocupação e indica algumas possibilidades e iniciativas para aproximar a juventude.
Segurança alimentar e estratégias de salvaguarda
Durante o processo de formulação do dossiê e registro do sistema agrícola como patrimônio o ISA, o projeto de pesquisa Pacta (Populações, Agrobiodiversidade e Conhecimentos Tradicionais Associados/Unicamp-CNPq e IRD) e o próprio Iphan apoiaram a Acimrn e a Foirn na realização de encontros sobre patrimonialização, divulgação do processo de registro e levantamentos participativos acerca de iniciativas desejadas para a salvaguarda do bem. Com estas consultas, tornou-se patente a preocupação dos povos indígenas com a desvalorização de seus modos de vida, especialmente, em relação a transmissão de conhecimentos xamânicos, benzimentos e rituais, bem como, sobre as técnicas de tecer os utensílios e de processar os alimentos. A segurança alimentar, garantida pela base da diversidade de receitas e plantas cultivadas, também foi destacada como uma das preocupações nestes fóruns de discussão.
Desta forma, entre as ações de salvaguarda previstas no dossiê estão: a) mobilização de jovens indígenas para pesquisas e registros de audiovisual sobre o modo de fazer roça de antigamente, o atual e do futuro, sobre benzimentos e mitos de origem das plantas; b) valorização dos dabucuris (rituais de trocas de bens) e c) fomento a realização de feiras e outras modalidades de escoamento e valorização do produto regional.
Vale lembrar ainda que entre os dias 4 e 5 de novembro, o Conselho reconheceu outros cinco bens como Patrimônio Cultural Brasileiro: 1) Encontro das Águas do Rio Negro e Solimões, no Amazonas; 2) o ritual Yaokwa, dos índios Enawenê Nawê, que vivem na zona de transição entre o Cerrado e a Floresta Amazônica, em Mato Grosso; 3) o conjunto urbanístico e paisagístico da cidade de São Félix, na Bahia; 4) o Monumento aos Mortos da II Guerra Mundial, no Rio de Janeiro; 5) o conjunto histórico e paisagístico de Santa Tereza, no Rio Grande do Sul.
http://www.socioambiental.org/noticias/nsa/detalhe?id=3227
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